Juliana Rigol
O desejo de experimentar as minhas ideias foi sempre a causa das minhas decisões. Gestar, parir e maternar na vida imigratória fora um grande marco de autorrealização e a chance de mudar a vida de direção.
Imigrei no desejo de experimentar a vida de forma singular, quebrando as minhas próprias expectativas e condicionamentos. Desejei achar sentido em existir em um outro tempo, vivendo os ciclos da vida, com afetações novas, menos currado e baseado em disputas por necessidades básicas de teto, comida, direito a férias e na frágil e infantilizadora sensação de domínio.
Desejei um cotidiano lento, que me permitisse sentir mais, refletir mais e estava disposta a ir à caça de referências que deveriam dar conta da minha curiosidade intelectual e inquietudes existenciais.
As experiências de parir e nutrir meus filhos me trouxeram muita clareza para perceber minha potência para criar, como também, meus limites individuais e sociais para transformar a realidade distópica na qual vivemos.
Uso o prazer-e-o-desejo como ideia-prima, compostos de sensação.
Percebe-se através do corpo, e não pela via da razão, moral, que interdita a expressividade. Sentir é movimento de sensações, de fluxo sensorial. Sente-se colocando-se em relação, que, por sua vez
está implicada na interconexão e interdependência com o que aparece disjunto.
Parto do desejo e do prazer sensorial para chegar no corpo que possui o útero, esse órgão da diferença histórica da realidade de controle e da disciplina moral e repressora. Útero, como metáfora da potência criadora, que é de propriedade de um corpo, que deseja, que possui volição. Útero que na sua forma criadora, é criador de prazer ocitocinógeno, endorfinógino, relacional e produtor de virilidade feminina protetora, na concepção mamífera, orgânica, sexual e sensual, não objetificada, não capturada pelo desejo do outro, desobediente para reter o que gesta, expansivo, além do limite comparativo com os outros órgãos. Pensar o prazer a partir do útero, provoca explosões de ideias divertidamente apocalípticas ao mesmo tempo que confronta concepções morais, contesta o sistema patriarcal de dominação pela opressão física e subjetiva, abuso e normalização de violência histórica.
Do desejo pelo prazer de descobrir quem sou na minha mais espontânea e íntegra versão, a arte me foi revelada. Foi um reencontro com uma essência inocente, viril, atrevida e voraz que produz afetações de abertura, novos desejos, de expansão da consciência mátria.
O mundo patriarcal que impõe violentamente a realidade hegemônica social é uma distopia aberrante que me tensiona todo dia. Sou uma mulher, mãe, imigrante latino-americana indignada com o macropoder colonial estruturado na dominação raça-gênero, por isso busco meios de implodi-lo de dentro para fora, tendo os limites e transbordamentos do corpo como remédio de resistência e de luta micropolítica.
Ser artista é meu antídoto.
Encontro na arte uma maneira de subverter minha vida e profecias coloniais de destino.
É a maneira que encontro de me implicar verdadeiramente na transformação social tendo no horizonte a utopia de um mundo onde a dominação não determinará a vida das relações.